domingo, 12 de agosto de 2012

HOMILIA NA SOLENIDADE DA PADROEIRA SENHORA SANTANA



Dom Ottorino Assolari
Bispo Diocesano

“Senhor, que é o homem para dele assim vos lembrardes e o tratardes com tanto carinho? Pouco abaixo de Deus o fizeste coroando-o de glória e esplendor”. É assim que o salmo 08 proclama a grandeza e a dignidade do homem.

É do homem que pretendo falar nesta festa de nossa excelsa Padroeira, sem entrar na questão do gênero, mas olhando à pessoa humana, seja ela homem ou mulher. Do meu ponto de vista, é urgente abordar este tema para que se possa recuperar a grande dignidade da pessoa humana, hoje, infelizmente, tão pouco valorizada, apesar dos proclamas constitucionais e da ênfase das instituições e organizações nacionais e internacionais.

A nossa fé, fundamentada na Palavra de Deus, leva a considerar o homem em sua unidade e totalidade, corpo e alma, coração e consciência, inteligência e vontade; por isso a Igreja, considerando a vocação altíssima do homem e afirmando existir nele uma semente divina, oferece ao gênero humano sua colaboração sincera para que corresponda a sua vocação (Cfr. G.S. 203-204).

Criado por Deus, o homem não pode renunciar às exigências espirituais, porque seria incompleto, mutilado. O homem, mesmo imerso em meio a forças desagregadoras, em meio a chamados contraditórios, sente em si o desejo do divino, o desejo da imortalidade. Mas é difícil responder a estes desejos do nosso interior numa sociedade que difunde um clima de indiferença e até de hostilidade às fundamentais exigências religiosas e morais.

É evidente que o mal existe no mundo, que inúmeras são as inquietações, os desequilíbrios sociais e familiares, as divisões entre as raças e as nações, entre os ricos e os pobres; a violência cresce de forma assustadora e se reveste de várias formas; a corrupção na sociedade recrudesceu, envolvendo os poderes públicos e até o sistema judiciário que inclina seu juízo a favor dos poderosos e gera impunidade; alguns parlamentos ou assembleias legislativas chegaram a aprovar leis injustas contra os direitos humanos (Cfr. Cap. II DAp).

Quem sofre por tudo isso é o homem: a pessoa humana é deturpada, interiormente ferida, psicologicamente fragilizada, frustrada nos seus ideais. No rosto do homem não brilha mais a dignidade recebida por Deus. O filósofo grego Diógenes, em pleno dia de sol, ia passando pelas ruas da cidade com uma lanterna acesa, em atitude de busca; o povo divertido perguntou-lhe: o que você está buscando, Diógenes? Respondeu: o homem! Com certeza, ele queria dizer que era difícil encontrar um homem digno deste nome. E nós, hoje, temos a mesma percepção.

É preciso combater o mal, mas ainda mais é preferível intensificar o bem e definir a verdade: este é e continuará sendo o esforço da Igreja, porque ela bem sabe que quem exclui Deus de seu horizonte, falsifica o conceito da realidade e só pode terminar em caminhos equivocados e com receitas destrutivas (DAp. 44).

Mas, por onde começar? Indico a urgência educativa para uma sólida formação cultural cristã, capaz de preparar as novas gerações a enfrentar os desafios do futuro. Os jovens de hoje, o que eles receberam, em formação e educação, pelas suas famílias e pela sociedade? Há décadas que a formação e a educação não estão mais nas mãos dos pais, nem da escola, mas monopólio de uma sociedade que perdeu o sentido transcendental da vida e dos meios de comunicação que descaradamente propõem aos jovens uma falsa visão da realidade, oferecendo o que é mais cómodo, mais útil, mais prazeroso, mais vantajoso. O resultado se vê no alto número de envolvidos nas drogas e na vida bruta e marginal, outros sem nenhuma expectativa para o futuro, outros ainda, de famílias bem abastecidas, com um vazio moral que os leva ao descontrole, à imoralidade e ao desrespeito de todos os valores. A maioria destes jovens não conhece a mensagem evangélica que enaltece a dignidade humana. Temos que voltar a educar aos valores verdadeiros como: a centralidade da pessoa na sociedade, no trabalho e na economia; a sacralidade da vida em todas as suas fases; a família como elemento fundamental e um grande investimento nos jovens. Estes valores, impregnados pelo espírito cristão, poderão formar verdadeiros cristãos e cidadãos exemplares: assim a dignidade humana será recuperada.

Mas uma segunda reflexão acho ainda mais urgente hoje: trata-se do mesmo assunto mas com uma agravante a mais. Quero falar do homem que é impedido de nascer, negando-lhe direitos e deveres e tirando-lhe totalmente aquela dignidade que já tem como embrião. Tratamos do gravíssimo problema do aborto, porque uma farta documentação, encontrada no Diário Oficial da União, mostra que o governo Dilma, através do Ministério da Saúde, em convênio com a fundação Oswaldo Cruz, contrariamente às promessas que a presidente havia assumido durante a campanha eleitoral, está dando continuidade a novas iniciativas para implantar o aborto no Brasil.

A nova estratégia foi apresentada pelos principais jornais brasileiros na primeira semana de junho: o Ministério da Saúde prepara uma Norma Técnica pela qual o Sistema de Saúde brasileiro passará a acolher as mulheres que desejam fazer o aborto e orientá-las sobre como usar corretamente os métodos existentes para abortar. Trata-se de uma estratégia para violar a lei, para depois derrubar a lei.

A Ministra Eleonora Menicucci, da Secretaria da política das mulheres, afirmou que somente é crime praticar o aborto, mas o governo entende que não é crime orientar uma mulher sobre como praticar o aborto. O Ministério também pretende liberar para o público a venda de remédios abortivos, hoje de uso reservado à rede hospitalar. Desta maneira, os médicos poderão orientar as mulheres sobre como praticar o aborto seguro e os medicamentos necessários estarão amplamente disponíveis para o público em todas as farmácias.

Como católicos, temos que denunciar este vergonhoso engano dos abortistas que favorece o crime de matar uma vida inocente e totalmente indefesa, denunciar a atitude cínica daqueles que pretendem implantar esta Norma Técnica, baseada em princípios imorais; ao mesmo tempo, temos que proclamar com força e convicção profunda que todos têm direito à vida e que nenhuma legislação jamais poderá tornar lícito um ato que é intrinsecamente ilícito.

Já na Campanha da Fraternidade de 2008, cujo tema era “Escolhe, pois, a vida”, a CNBB tinha-se posicionado sobre o tema da vida com extrema clareza, dizendo que: o início da vida se dá na fecundação e por isso o embrião é uma nova vida, um novo ser, um novo indivíduo, que Deus é Senhor e amigo da Vida e que o aborto é inaceitável, expressando a esperança que a vida seja respeitada como inviolável em consonância com a Constituição Brasileira, a Declaração Universal dos Direitos Humanos e o Estatuto da Criança e do Adolescente. Chegamos a este absurdo: temos leis que protegem ovos de tartaruga e, ao mesmo tempo, leis que permitem matar o embrião humano!

O compromisso de todos os católicos e de todos os que amam e valorizam a vida é o de transmitir e testemunhar a importância e a necessidade de acolher e respeitar integralmente a vida em todas as fases de desenvolvimento e comunicar, especialmente aos jovens, a beleza da paternidade e maternidade responsáveis. Sim, a vida é dom, é maravilha, é compromisso: não nascemos por acaso, mas por amor.

O mandamento de Deus: ‘não matarás’, continua com todo seu valor e sua força e para os que estão a favor do aborto, a Palavra de Deus chegará às suas consciências, como chegou a Caim: “Onde está o teu irmão Abel? Que fizeste? Ouço o sangue de teu Irmão, do solo, clamar para mim” (Gn. 4,9-10).

Meus irmãos, minhas irmãs, dirigimo-nos a nossa querida Padroeira Senhora Santana, apresentando-lhe nossos pedidos, nossas preocupações, nosso desejo de viver uma vida digna e de proteger sempre a vida.

Senhora Santana, olhai para este povo que vos venera com tanto carinho e ajudai-o, neste tempo de “pós-humanidade”, caracterizada cada vez mais por uma mentalidade anti-vida, anti-matrimônio, anti-família, anti-homem imagem de Deus, ajudai-o a viver conforme vossos exemplos de vida e intercedei por nós a proteção de Deus. Amém.


Fonte: Site da Diocese de Serrinha

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